A discussão sobre refugiados aqui na Alemanha me desperta muitas emoções. De um lado, a empatia, aquele sentimento de impotência por não poder acabar com seus sofrimentos; aquela identificação automática que me impede de fazer um trabalho voluntário, porque eu ia apenas abraçar um criança, sentar no chão e chorar com ela nos braços.
Do outro, o fato de eu, nesse país e continente, ser tão estrangeira quanto eles. E me sentir afetada por toda essa discussão do que é certo ou errado, sobre quem tem direito de estar aqui ou não, sobre quem tem o direito de continuar lutando pra viver ou terminar de morrer na guerra ou nas barreiras construídas pelos países fronteira. Sobre ser bem vinda.
Eu viajei pra Polônia de férias. Eu gostei de lá. Voltaria. Não volto mais. E também não tenho mais vontade de visitar países que construíram muros e cercas, que viraram as costas, que ignoram o problema, a situação.
Aqui, eu vejo uma Chanceler desesperada, tentando fazer a política que lhe cabe, declarando que se não houver uma solução, “esse não é o país em que ela quer viver”. Mas, ela tem que brigar não só com os políticos de um país, como também com os de um continente, uma “união” em frangalhos. Além de uma população reacionária, que comete crimes e coloca fogo em asilos de refugiados, nem são presos, nem vistos como realmente deveriam ser: como terroristas. E eu me pergunto: é nesse país que quero viver? Sou mesmo bem vinda ou apenas tolerada?
Eu não quero tolerância. Eu não quero me sentir pedindo autorização para viver aqui. Tolerância, para mim, parte sempre de uma relação de poder: eu, o branco europeu, permito que você viva aqui, eu te tolero porque sou bonzinho e indulgente.
Recuso-me a viver com a sensação de que sou apenas tolerada.
A impressão que tenho é que estamos à beira de um colapso. De uma hora pra outra, todos os não-europeus, que por hora são tolerados aqui, serão os novos “judeus” em pleno século XXI. E isso é de uma hipocrisia sem tamanho. Europa não vive sem a exploração do outro, sem a mão de obra escrava ou mal paga do outro, sem as matérias primas e sem lobby. A diferença é que eles, os não-europeus, nunca deveriam ter saído de lá. Mesmo que as desgraças “modernas” sejam culpa da Europa. Desde a colonização até hoje.
Até quando e o quanto os refugiados e eu suportaremos?
No final, somos todos seres humanos mas, humanidade só alguns têm.
Ivana disse:
Te entendo perfeitamente. Já tive esta discussão com meu marido, alemão, por diversas vezes e não chegamos a um consenso nunca. Eu admiro a posição da chanceler, acho que a Alemanha deu um exemplo de solidariedade ao abrir as portas aos refugiados enquanto os países que ergueram muros, ainda que sejam países “mais pobres” do que a Alemanha, mostraram a sua intolerância e falta de boa vontade. Não entendo como alguém consegue fechar as portas para pessoas que estão apenas tentando sobreviver. Tenho certeza de que esses refugiados, como estamos chamando aqui, prefeririam estar no país aonde cresceram, construíram família, estavam em casa e jamais deixariam tudo para trás para mendigar abrigo em um país aonde não são bem vindos. Eles simplesmente não tem alternativa. O que está acontecendo é que a Alemanha está praticamente sozinha nesta iniciativa e o país tende a ficar sobrecarregado… os nativos começam a temer se tornar minoria em seu próprio país, temem perder a identidade cultural e por fim, seus empregos e sua liberdade para a maioria não-alemã. É um medo infundado? Não sei. Só sei que se os demais países dessa “união européia” se dispusessem a ajudar, a situação seria completamente diferente. Mas não é o caso. A Europa colonialista, que fomentou tantas guerras, exploração e escravidão, só está disposta a jogar quando a vitória é garantida. Ceder não é uma opção.
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essatal disse:
Exatamente. É como se estivéssemos sozinhos no campo de guerra dos outros. Entendo os que estejam arredios. Mas não entendo e nem aceito quem não tem empatia e ainda parte pra violência. E isso ainda falando em rede nacional. Eu, de cá, como estrangeira, me sinto perdida no meio dessa zona também. 😦
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Luana disse:
Sinceramente, nem sei o que pensar sobre isso, o mundo anda tão louco e eles infelizmente são conhecidos por sua guerra santa em nome do tal deus deles, são conhecidos por serem extremamente intolerantes e pouco se adaptarem ao país novo e sim querer que o país novo se adapte a eles, enfim, não que isso seja regra, lógico, que todos sejam assim. O fato de muitos deles fazerem m””” no país onde foram acolhidos, como estuprar, espancar mulheres e até mesmo homens com certeza ajuda os nativos a ficarem com o pé atrás. Não sei, sinceramente. É muito triste, tem que se ajudar sim, mas com cautela.
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essatal disse:
Concordo que há diferenças culturais, sim. E a adaptação pra quem vem do oriente é mais difícil. Mas, não é bem assim em relação a eles serem resistentes à adaptação ou violentos. Eu tenho vizinhos libaneses e muçulmanos, trabalho com curdos, tenho contato com famílias do Iraque e todos falam alemão e têm uma vida digna. O problema é exatamente essa propaganda negativa, boatos que viran verdades e que só contribuem para aumentar a apreensão que existe. Já existem “casos de sucesso” na Alemanha, por exemplo. E acho que é nisso que temos que focar. Bjs!
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Luana disse:
Eu entendo sua visão, afinal é o que você viveu/vive, mas por outro lado tem inúmeras outras pessoas que viveram o contrário, como uma amiga que via eles com bons olhos até três deles arrumarem confusão com ela e o namorado em um bar/café aí na Alemanha, assim, de graça, minha amiga e o hoje marido são pessoas super do bem, os três muçulmanos foram pra cima do então namorado dela pra quebrar mesmo, ela vendo entrou no meio pra tentar impedir o espancamento do namorado e apanhou também, afinal eram três homens contra um homem e uma mulher, mulher essa que claro não tinha metade da força física deles. A sorte deles é que alguém chamou a polícia, ou podiam até ter sido mortos, já que ninguém no local entrou no meio pra tentar ajudar, separar, mas pelo menos chamaram autoridades policiais. Pelo que convivi com eles os acho bastante intolerantes e não se adaptam muito bem, os amigos que tenho na Suiça relatam o mesmo. Eu hoje em dia já não convivo com eles, estou pela terra do tio Sam agora. Esses tipos de coisas ajudam os nativos a ficarem com o pé atrás, reticentes, mas como disse e repito há pessoas boas também nesse meio, assim como em qualquer nacionalidade, e diante a situação creio que deve sim se ajudar, mas não a todo custo, haja o que houver, um pouco de cautela nesse casos nunca cai mal. O tal atentado na França, um dos terroristas entrou pela Grécia com passaporte de refugiado, foi noticiado por vários meios sérios de comunicação, a informação foi dada por um ministro da Grécia, acho, e assim tantos inocentes morreram! Enfim, ajudar sim, mas com cautela.
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essatal disse:
Verdade. Tem muita coisa que me faz pensar estando aqui na Alemanha. Uma coisa que você citou, por exemplo, que outras pessoas não ajudaram seus amigos e só chamaram a polícia. Acontece muito aqui. O problema é que se alguém se metesse e desse um murro em um para defender uma mulher de ser espancada, ele poderia ser julgado por agressão e não por legítima defesa… o que desencoraja muita gente em ajudar. Enfim, ando bem reflexiva no que diz respeito à cultura alemã tb. Bjs!
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Milena - Viver Plenamente Paris disse:
O assunto é muito complexo e infelizmente ninguém tem solução. Tenho vontade de dizer que todo mundo teria o direito de morar onde quiser, de vir para a Europa… Não conheço muito bem a situação da Alemanha, mas na França o indice de desemprego estah muito alto, como criar 300 mil empregos para os 300 mil refugiados que dizem que não acolher (mas que jah entraram muito mais)? Quem não tem emprego, ou vai viver de ajudas sociais ou vai partir para o crime, prostituição e outros meios…
Além disso, não podemos esquecer que alguns dos terroristas do ultimo atentado em Paris tinham entrado na Europa como refugiados, com falsos documentos, se fazem passar por sirios (ou outros em sofrimento). nesse sentindo, mesmo não sendo “européia”, fico com medo e acho que deveria existir um melhor controle…
Particularmente, quando cheguei aqui na França tentei entender os muçulmanos e fazer amizades com as mulheres, mas realmente não consegui, achei as mulheres muito fechadas e nenhum interesse em alguém que não seja da mesma religião nem da mesma “região geografica”. Os homens, sem exagerar, me tratam como puta e não mostram nenhum respeito para com as mulheres. Não tem praticamente um dia que não me chamem na rua de “puta marroquina”, por mulheres geralmente, os homens correm atras e insistem mesmo. Pelo que en tendi fisicamente eu sou parecida com as mulheres do norte da Africa, e eles acham que eu deveria cobrir a cabeça, os braços, etc. Outro dia fiquei chocada ao entrar na sala de espera no dentista, um casal de muçulmanos (homem barbudo, mulher com o nijab e 3 crianças): entrei, disse “bonjour” e me sentei de frente para eles, pois a familia ocupava os 5 lugares do lado oposto. O homem ficou tão irritado, bufando, puxou a cadeira dele e virou, ficando de costas para mim. Falei em arabe com a familia e a esposa e os filhos fizeram a mesma coisa. Não sei se você imagina como eu me senti, esperando ali naquela situação. A vontade que eu tinha era de ir embora, mas meu tratamento era toda a semana na mesma hora, eu não iria atrasar o meu tratamento por isso!!! O dentista me disse que viu e quis recusar o atendimento da mulher (era ela que tinha horario marcado, ainda por cima o marido entrou junto, pois a mulher não poderia ficar sozinha com um homem, enquanto os filhos ficaram de costas para mim na sala de espera), mas se ele tomasse uma atitude seria acusado de racismo ou algo do tipo, como outros colegas dele que teriam “recusado atendimento” por razéoes semelhantes.
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essatal disse:
Nossa, Milena! Que situação horrível! Eu não saberia como reagir… muito complicado. Recentemente presenciei um cena triste também. Mas de uma alemã discutindo com uma turca por estar falando ao telefone. A alemã se sentiu incomodada. Aí pra ofender, perguntou se a outra não tinha um emprego! Pq na cabeça de alemão, vc tem que ter emprego pra ter direitos e estrangeiros não trabalham ou têm capacidade de… acho triste esses atritos por conta da situação atual.
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gabrilagrossi disse:
Puta texto Eve! É uma questão difícil mesmo, sensível porque esbarra em muitos fatores…
Morando na Alemanha eu sempre me perguntei o que significava integração pra ele. Veja, eu frequentei a Uni na alemanha, falo alemão, tarabalhei na alemanha, porém, sempre me senti tolerada aí. O apice pra mim foi quando meu filho entrou no kindergarten. Foram pequenas coisas que somadas fizeram com que tomassemos a decisão de não criar um filho “alemão “.
É cedo demais pra eu falar, mas eu acho que a aqui no UK as coisas sao mais leves. Sobretudo na maneira como meu filho foi recepcionado na escola. Pra vc ter uma ideia ate tradutora paga pelo estado ele tem, para ajuda-lo com a lingua e na integração. Pode ser que eu tenha escolhido o kindergarten errado…
Eu entendo que muitos “muçulmanos” vivam em nichos, não queiram se integrar… Mas eles já vivem na europa e deveriam, (não sei se esse é o verbo) relativizar as proprias crenças e a propria cultura.
No entanto, quando falamos em refugiados penso ser diferente. São pesoas fugindo de uma situação de conflito, guerra; sao pessoas sem ter onde ficar e nem pra onde ir. Se terroristas excrotos entraram como refugiados pra fazer aberrações, não podemos generalizar, mas pensar em politicas mais eficazes de acolhimentos para pessoas em situação de extrema necessidade.
Sorry pelo textão. Quem sabe a gente se encontra num Pub e conversa sobre isso e outras coisas mais acompanhadas de umas boas cervejas.
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essatal disse:
Obrigada!!!! Vc entendeu exatamente o que eu quis dizer com a questão da tolerância. E essas coisas só ficam mais evidentes com a problemática dos refugiados. Bjs!
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serendipity disse:
Exatamente, Eve! A palavra é tolerados.
Belo texto e infelizmente muito verdadeiro. Falou ao meu coracao. E faço e refaço essa pergunta frequentemente.
Meus dois filhos vão a um Kindergarten que é iniciativa de pais, mais “aberto” como o grupo de pais, maioria alemães, descreve. Recentemente, chegou uma menina síria. Antes dela havia uma albanesa, cuja família teve de ir embora, já que a Albania é considerada um pais seguro pelas autoridades alemãs. Por empatia, fiquei muito amiga da família síria. E sinto ate hoje depois de quase 2 anos lá que sou tolerada. Ja ate me perguntaram se eu era a baba dos meus filhos. Nem preciso dizer o quanto me machucou profundamente. Enfim. Mas esse episódio desvela um pouco a mentalidade, pré-conceitos, etc por trás dessa relação com os estrangeiros.
Eu penso que essa abertura nada mais é a tolerancia pra garantir uma imagem de bondade. Sabe tipo a cota de gente diferente. Que na hora das conversas mostram o quanto “se é engajado e cool”. No meu circulo de relacoes tenho esse e aquele perfil. O Porta dos Fundo fez um video que descreve um pouco o que quero dizer: https://youtu.be/NxzUU-cZD1o
Claro, não é tão a ferro e fogo. Claro, ha pessoas legais e que fazem isso de coração aberto e com bom senso, como a Angela Merkel defende.
Claro, todo mundo tem valores e pensamentos pra refletir e repensar.
Desculpe o desabafo. Gostei muito do que voe escreveu.
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serendipity disse:
mais pro debate: http://migre.me/tFWoF
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essatal disse:
E eu tb gostei muito do que escreveu! 🙂 é por aí. E é geral, acontece com “estrangeiros” (exclusos os escandinavos, ingleses e outros “níveis”)
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